segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Palavras do escritor Miguel Torga (quando da fundação da CPLP,1996)

Texto de Miguel Torga, de uma mensagem enviada quando da fundação da CPLP. "Impossibilitado de participar pessoalmente nessa feliz iniciativa de fundação da Comunidades dos Países de Língua Portuguesa, venho, desta maneira saudar calorosamente os seus ilustres e activos obreiros, e afirmar mais uma vez o que sempre pensei e disse em letra redonda, que é na língua comum que temos todos, filhos de Europa, da África e da América, o maior patrimônio histórico e cultural, e garantia eterna da nossa identidade.

Língua nascida numa Pátria exígua territorialmente, mas que ela alargou aos cinco continentes, graças ao seu dom expressivo e proteico, que lusitanizou, brasilizou e africanizou terras e almas. Grácil e subtil logo no berço, em breves cantigas de amor ou de maldizer, ao cabo de oitocentos anos, não só conserva o viço inicial, como floresce dia a dia em sambas, modinhas, mornas e obras literárias de largo fôlego. Não há ritmo de verso de que não seja capaz, arroubo épico para que não tenha alento, andamento narrativo a que não saiba dar balanço.

Fizeram e fazem esse milagre povo anônimo reinol, os marinheiros aventureiros, os bandeirantes, os tropeiros sertanejos, os escravos das senzalas, e gênios e talentos que vão de Camões e Gil Vicente a Machado de Assis e Euclides da Cunha, José Craveirinha e Luandino Vieira.

Exaltar e promover esse patrimônio sagrado é mais um dever imperativo de povos que o destino quis que fossem de irmãos miscigenados e é como membro orgulhoso da nossa família multirracial, e é como garimpeiro nos aluviões do idioma materno, que faço votos para que todos sejamos seus firmes defensores e dignos merecedores da glória de o servir".

Miguel Torga, 14 de dezembro de 1996

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